quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Uso das TICs diminui abismo digital entre nações ricas e pobres, mas países emergentes ainda estão atrasados

 

Adriana Martinelli, Coordenadora da Área de Educação e Tecnologia do Instituto Ayrton Senna

O uso das tecnologias está diminuindo o abismo digital entre países ricos e pobres, segundo relatório da Conferência da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD, na sigla em inglês), lançado no início de fevereiro. A pesquisa revela uma maior proximidade nas taxas de inclusão digital entre os países desenvolvidos e aqueles em desenvolvimento à medida que telefones celulares e internet, por exemplo, se tornam mais disponíveis à população. “O mundo emergente, entretanto, ainda está muito atrás”, aponta o relatório.
Nos últimos cinco anos, o total de usuários de telefones celulares praticamente triplicou nos países em desenvolvimento, o que corresponde a cerca de 58% dos usuários de celulares do mundo. "A região da América Latina é responsável pela terceira maior taxa de crescimento no número de celulares. Brasil, México, Argentina, Colômbia e Venezuela são responsáveis por 75% dos novos assinantes da região", afirma o relatório.
De acordo com Adriana Martinelli, coordenadora da área de Educação e Tecnologia do Instituto Ayrton Senna, o uso das tecnologias pode diminuir a exclusão digital e social nos países em desenvolvimento. “O Instituto Ayrton Senna acredita que oportunidades efetivas de inclusão digital garantem a inserção social dos jovens e adultos na sua comunidade e no mercado de trabalho, preparando-os para realizar transformações em qualquer domínio: pessoal, social, político e cultural”.
“Mais do que oferecer o acesso à tecnologia, é necessário desenvolver ações que garantam aos usuários não só o domínio técnico, mas, principalmente, ações formativas que os possibilitem desenvolver competências para usar a tecnologia como ferramenta de aprendizagem, o que implica em: buscar, armazenar, organizar, analisar e disseminar informações na Internet; discutir, criticar e avaliar as informações obtidas em processos interativos e colaborativos on line; desenvolver estratégias de gestão e produção de conhecimento; desenvolver as quatro competências necessárias para a vida: pessoal, relacionais, cognitivas e produtivas”, acrescenta Martinelli.

Beatriz Rizek, Diretora da Rizek Assessoria Cultural

A opinião é compartilhada por Beatriz Rizek, diretora da Rizek Assessoria Cultural, que acredita nos encontros de informática como meio de inclusão digital. “Eventos como a Campus Party precisam ser replicados nesses países, de acordo com a infra-estrutura e as iniciativas locais. Em São Paulo, por exemplo, a Escola do Futuro da USP (Universidade de São Paulo), então sob coordenação científica do professor Fredric Litto, realizou sete edições do Computer Jamboree, a farra da informática, evento similar ao Campus Party, porém, com proposta bem mais modesta, mas foi um início!”.
Para Carlos Seabra, diretor de Tecnologia e Projetos do IPSO (Instituto de Pesquisas e Projetos Sociais e Tecnológicos), a internet não diminui a exclusão digital se não for concomitante com outras práticas de investimentos. “A internet em si não diminui a exclusão, assim como lápis e papel ou livros não acabam sozinhos com o analfabetismo. Inclusão digital pressupõe apropriação, pressupõe eliminação de exclusão social. O acesso à internet pode colaborar muito com a exclusão digital e social se for articulado com outras políticas e investimentos, se levar ao engajamento do cidadão no acesso às informações, tornar-se um instrumento efetivo de comunicação, fomentar o protagonismo, engajar jovens, donas de casa, terceira idade, professores, lideranças comunitárias etc”.

Carlos Seabra, Diretor de Tecnologia e Projetos do IPSO - Instituto de Pesquisas e Pojetos Sociais e Tecnológicos

De acordo com o documento da ONU, o uso da internet aumenta cada vez mais, mas países desenvolvidos ainda são responsáveis pela maior parte dos usuários e têm as maiores taxas de penetração entre suas populações. "Em 2002, a disponibilidade de internet em países desenvolvidos foi 10 vezes maior do que em países em desenvolvimento. Em 2006, foi seis vezes maior", informa o relatório.
A UNCTAD revelou que o uso das TICs está se tornando uma prática cada vez mais freqüente no mundo emergente, mas ressaltou que muitas ações precisam ser feitas. Mais investimento dos países em capital humano e infra-estrutura, além da elaboração de melhores regulamentos e leis para a Internet estão entre as recomendações.
Para Beatriz Rizek, a diferença dos números do uso e da penetração da internet entre os países desenvolvidos e os emergentes pode ser diminuída com mais ações do governo. “É preciso que a Câmara dos Deputados aprove o Projeto de Lei 1481/07, que torna obrigatória, até 2013, a universalização do acesso a redes digitais de informação, inclusive à internet, em estabelecimentos de ensino de todo o País, abarcando tanto instituições públicas quanto particulares, da Educação Básica ao ensino superior. A proposta prevê, ainda, a oferta de um computador com acesso à internet em cada turno da escola para cada grupo de dez alunos. Se isto se consolidar, acredito que o abismo digital tenderá a diminuir”.
De acordo com Carlos Seabra, essa distância cairá cada vez mais, dadas as características tanto das novas tecnologias quanto da essência do modelo econômico, que não se sustenta apenas em mercados ricos e nas classes mais altas, levando a disseminar cada vez mais o acesso à internet e aos computadores em todas as classes e países. “Isso, porém, não garante a inclusão digital, como a entendo, pois não basta ‘sentar um pobre na frente do computador’ para que tal ocorra. É necessário trabalhar educação, cidadania e cultura - e nisso a informática e a internet são poderosos ‘cavalos de Tróia’ que podem ajudar a superar as muralhas excludentes da injustiça social e planetária”.
“É fundamental que se somem esforços de políticas públicas, envolvendo ações governamentais, comerciais e do terceiro setor, pois somente as forças do mercado não garantem que não se venha a criar um novo tipo de clivagem, incluindo digitalmente uma parcela dos excluídos e deixando os mais excluídos ainda em uma espécie de apartheid tecnológico. Finalmente, há que se levar em conta também o custo da tecnologia, pois os cartéis de comunicação fazem com que a estreita banda larga no Brasil seja muito mais cara que na Europa ou nos Estados Unidos”, acrescenta Seabra.

FONTE:

http://www.odisseu.com/TicEducacao/Newsletter/04_20fev2008/index.html

sábado, 28 de agosto de 2010

Seminário nacional debate políticas públicas de TIC em Salvador

Seminário nacional debate políticas públicas de TIC em Salvador

A necessidade da ampliação da infraestrutura de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC), a importância dos softwares livres para a implementação de políticas públicas e o poder de compra do Estado como indutor de desenvolvimento do setor.

Estes foram os principais assuntos debatidos, nesta quinta-feira (8), no 39º Seminário Nacional de (TIC) para a Gestão Pública, que, pela terceira vez, acontece em Salvador e prossegue até esta sexta (09), com ampla programação, no Grand Hotel Stella Maris.

O secretário do Planejamento, Walter Pinheiro, destacou que há pouco tempo apenas 20 dos 417 municípios baianos possuíam Banda Larga. “Como chegam os serviços públicos de governo (e-gov) nesses lugares se não for a partir da implantação de infra-estrutura?”, questionou Pinheiro.

Na sua exposição, o secretário traçou um quadro evolutivo de TIC no Brasil, destacando o programa Banda Larga nas Escolas, cujo objetivo principal é dotar todas as escolas públicas do País com infraestrutura de banda larga (acesso rápido à internet) até 2010.

Pinheiro citou que o Brasil possui um grande potencial para a produção de conteúdo digital e softwares, tomando como exemplo o Ginga, software livre desenvolvido no Brasil e que hoje compõe diversos sistemas de TV Digital. “Iniciei o debate acerca da importância da adoção dos softwares livres pelos poderes públicos em 1999, com o Projeto de Lei nº 2.269. Os governos precisam fomentar a produção desses programas e uma forma efetiva de fazer isso é utilizando o poder de compra do Estado”, enfatizou o secretário.

Na mesma direção apontada por Pinheiro, a diretora do Departamento de Integração de Sistemas de Informação da Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação, do Ministério do Planejamento, Nazaré Bretãs, defendeu que a política de compra do governo federal deve ser repartida, com chances para que pequenas e micro empresas participem das contratações públicas. “Temos uma demanda enorme por soluções de TIC para o aperfeiçoamento da gestão pública, inclusive no que diz respeito a uma maior transparência na transferência de recursos federais”, explicou Nazaré.

Independência tecnológica

Para o coordenador de Responsabilidade Social e Cidadania do Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro), Dílson José dos Santos, a adoção do uso de softwares livres por parte do governo representa independência tecnológica e oferece condições para o desenvolvimento de conhecimento local. “No início dos debates sobre o uso dos softwares livres havia uma desconfiança generalizada acerca de sua eficiência. Hoje vemos, por exemplo, o Banco do Brasil utilizando-os em mais de 35 mil estações de trabalho e 560 servidores”.  

“No atual estágio da TIC no Brasil e no mundo, o Secop na Bahia é uma das coisas mais importantes para melhorar a governança do setor público”, declarou o diretor-presidente da Companhia de Processamento de Dados do Estado da Bahia (Prodeb), Elias Sampaio. O seminário é uma realização da Serpro em parceria com a Prodeb.

http://www.comunicacao.ba.gov.br/noticias/2009/10/08/seminario-nacional-debate-politicas-publicas-de-tic-em-salvador

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

domingo, 15 de agosto de 2010

Implicações das TIC´s na Educação

Muitos especialistas afirmam que "os avanços das TIC´s poderão revolucionar a pedagogia do século XXI, da mesma forma que a inovação de Gutemberg revolucionou a educação a partir do século XV" (HOLMBERG apud BELLONI, 1999, p. 55). Entretanto, essas tecnologias não substituirão de imediato as atuais, mas provocarão mudanças profundas na forma como se constitui a dinâmica do ensino, "[...] tudo depende da pedagogia de base que inspira e orienta estas atividades: a inovação ocorre muito mais nas metodologias e estratégias de ensino do que no uso puro e simples de aparelhos eletrônicos" (BELLONI, 1999, p. 73).
Segundo Palloff ; Pratt (1999) apud Soares (2000), as novas tecnologias podem enriquecer o ato pedagógico favorecendo uma efetiva interatividade entre os agentes do processo: alunos e professores. "Concluímos a través de nuestro trabajo com el nuevo médio (internet) que la comunidad educativa - com los professores participando em igualdad de condiciones com sus alumnos -, es la chave del éxito de todo el proceso." Como já dito anteriormente, não é a tecnologia que importa, mas a filosofia educativa que empresta sentido ao uso.
Segundo Moraes (1997, p. 190), precisamos colocar o conhecimento a disposição do maior número possível de pessoas, possibilitando a criação de potencialidades comunicacionais; criando também uma atmosfera de investigação, colaboração e reflexão crítica, permitindo uma aprendizagem contínua, permanente e autônoma.
Por aprendizagem autônoma entende-se um processo de ensino e aprendizagem centrado no aprendente, cujas experiências são aproveitadas como recurso, e no qual o professor deve assumir-se como recurso do aprendente, considerando como um ser autônomo, gestor de seu processo de aprendizagem, capaz de autodirigir e auto-regular este processo. Este modelo de aprendizagem é apropriado a adultos com maturidade e motivação necessária à auto-aprendizagem e possuindo um mínimo de habilidades de estudo (BELLONI, 1999, p. 39-40).
O ato de aprender não é uma mera acumulação de conhecimentos, mas uma interação de saberes vividos em sala de aula, onde professores e alunos articulam-se pela busca do conhecimento e pelo exercício da democracia. Este exercício democrático, também de interação intelectual-social, modifica nosso modo de pensar alterando nossa base cognitiva e emocional.
Perriault apud Belloni, (p. 28, 2001) salienta que os modos de aprender dos alunos ainda são uma incógnita para a maioria dos professores. Conhecer os métodos de aprendizagem mediatizada são fundamentais para compreendermos os processos da auto-aprendizagem.
As TIC, ao mesmo tempo em que fazem grandes potencialidades de criação de novas formas mais performáticas de mediatização, acrescentam muita complexidade ao processo de mediatização do ensino/aprendizagem, pois há grandes dificuldades na apropriação destas técnicas no campo educacional e em sua "domesticação" para utilização pedagógica. Suas características essenciais - simulação, virtualidade, acessibilidade a superabundância e extrema diversidade de informações - são totalmente novas e demandam concepções metodológica muito diferentes daquelas das metodologias tradicionais de ensino, baseadas num discurso científico linear, cartesiano e positivista. Sua utilização com fins educativos exige mudanças radicais nos modos de compreender o ensino e a didática (BELLONI, 2001, p. 27).
Aprendemos em diferentes contextos e de diferentes maneiras. Possuímos estilos de aprendizagem diferentes e esse conhecimento não pode ser ignorado pelo professor. Educar para a sociedade do conhecimento é compreender que devemos investir na criação de competências considerando os estilos individuais de aprendizagem e os novos espaços de construção do conhecimento. A busca por um equilíbrio faz com que pensemos sobre as ações pedagógicas mais democráticas que considerem os estilos de aprendizagem dos alunos, que redimensionem papeis do professor e do aluno, que revise as premissas filosóficas e epistemológicas, que orientam as ações educativas e que inclua as TIC´s como ferramenta mediadora da aprendizagem.
A utilização das TIC´s com ênfase na aprendizagem volta-se para o desenvolvimento das habilidades, expectativas, interesses, potencialidades e condição de aprender; todas essências ao processo educativo autônomo. Os alunos são estimulados a se expressarem pelas suas próprias idéias, a desenvolver a autonomia e a capacidade de se sociabilizar e construir conhecimento, o que exige um novo papel do professor.
Papel este que, ao que tudo indica, tende a ser cada vez mais mediatizado. O professor tende a ser amplamente mediatizado: como produtor de mensagens inscritas em meios tecnológicos, destinadas a estudantes a distância, e como usuário ativo e crítico e mediador entre estes meios e os alunos (BELLONI, 2001, p.27).
Para a autora, assumir esse novo papel compreende um novo desafio, o de aprender a trabalhar em equipe e penetrar em diferentes áreas disciplinares. A utilização das TIC´s focada na aprendizagem, exige funções novas e diferenciadas. "A figura do professor individual tende a ser substituída pelo professor coletivo. O professor terá que aprender a ensinar a aprender" (BELLONI apud BELLONI, 2001, p.29).
Orientadas para esses fins, as TIC´s na educação correspondem a descoberta de uma nova pedagogia. Uma pedagogia ativa que atenda as necessidades e anseios de uma sociedade que tem a comunicação como processo mediador da educação. Esses processos, configuram-se por uma alfabetização áudio-visual, coletiva e interativa que de certa forma desestabilizam os processos de organização tradicionais de ensino.
Um processo educativo centrado no aluno significa não apenas a introdução de novas tecnologias na sala de aula, mas principalmente uma reorganização de todo o processo de ensino de modo a promover o desenvolvimento das capacidades de auto-aprendizagem. Esta verdadeira revolução na prática pedagógica implica um conhecimento seguro da clientela: suas características socioculturais, suas necessidades e expectativas com relação àquilo que a educação pode lhe oferecer (BELLONI, 1999, p. 102-103).
A perspectiva das TIC´s é para que as múltiplas linguagens, em suas múltiplas vozes, amplifiquem os espaços educativos, constituindo um universo em constante processo de interação e transformação social. A ação comunicativa dessa nova pedagogia, dialética e interativa, favorecida e potencializada pelas redes telemáticas, orienta-se numa perspectiva de desenvolvimento da capacidade crítico-reflexiva do homem, numa interação social que atenda as necessidades emergentes da nossa sociedade e que de certa forma proponha ações mais justas e democráticas. Desta forma, preocupam-se os educadores, as TIC´s na educação devem ser orientadas de forma cuidadosa a fim de reforçar a humanização do homem.

Kassandra Brito de Carvalho
Sou pedagoga e professora de informática. Leciono há onze anos informática na educação. Participei de projeto junto a 3ª idade e recebi uma premiação pelos serviços prestados à Fundação de Rotarianos de São Paulo. Trabalhei dois anos com formação de professores da rede municipal de ensino de São Paulo antes de vir para Boa Vista. Lecionei para os três níveis de ensino e há cinco anos estou só no ensino superior. Desenvolvo projetos de sites institucionais e pessoais como autônoma e trabalho com formação didática para profissionais liberais.
5. BIBLIOGRAFIA

BELLONI, Maria. L. Educação a Distância. Campinas, SP : Associados, 1999.
BELLONI, M. L. O que é Mídia e Educação. Campinas, SP : Autores Associados, 2001.
HOLMBERG, B. Guided Didatic Converstion in Distance Education, in: SEWART, D. et alli (eds.) Distance Education: Internnacional Perspectives. Londres/Nova Iorque: Croomhelm/St. Martin´s, 1993.
MORAES, M. C. O paradigma educacional emergente. 3. ed. Campinas, SP: Papirus, 1997.
SOARES, I. de O. Educomunicação: um campo de mediações. Revista Comunicação e Educação. ECA USP, n. 19, p. 12, 2000.
SOARES, Ismar de O. Revista Nexos: estudos em comunicação e educação. Estudos em Comunicação e Educação in: La comunicación/Educación como nuevo campo Del conocimiento y el perfil de su profesional. São Paulo : Anhembi Morumbi, 1999.

Kassandra Brito de Carvalho
Mestranda em Educação (Unicamp-SP). Especialista em Tecnologias Interativas Aplicadas à Educação pela PUC-SP. Pedagoga e Orientadora Educacional pela Universidade São Marcos. Professora de Informática das Faculdades Cathedral em Boa Vista - Roraima
E-mail: kassandra@roraimaweb.com
Site: www.roraimaweb.com/kassandra
Fone: (95)- 623.9487

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

A Internet na Educação

Entrevista para o portal Educacional


José Manuel Moran
Doutor em Comunicação pela USP
E specialista em projetos inovadores na educação presencial e a distância

"A Internet nos ajuda, mas ela sozinha não dá conta da complexidade do aprender" A afirmação é do professor José Manuel Moran. Ele fala sobre o uso da Internet na educação, fundamentado seu pensamento na "interação humana", de forma colaborativa, entre alunos e professores.

José Manuel Moran é um dos maiores especialistas brasileiros no uso da Internet em sala de aula. Por isso, não se espere dele o deslumbramento do marinheiro de primeira viagem. Timoneiro experiente, ele conduz o barco devagar. Para o educador que acessa a rede pela primeira vez, ele adverte que nem sempre a maré está para peixe. "A Internet nos ajuda, mas ela sozinha não dá conta da complexidade do aprender hoje, da troca, do estudo em grupo, da leitura, do estudo em campo com experiências reais". A tecnologia é tão-somente um "grande apoio", uma âncora, indispensável à embarcação, mas não é ela que a faz flutuar ou evita o naufrágio. "A Internet traz saídas e levanta problemas, como por exemplo, saber de que maneira gerenciar essa grande quantidade de informação com qualidade", insiste.
A questão fundamental prevalece sendo "interação humana", de forma colaborativa, entre alunos e professores. Continua a caber ao professor dois papéis: "ajudar na aprendizagem de conteúdos e ser um elo para uma compreensão maior da vida". Se o horizonte é o mesmo, os ventos mudaram de direção. É preciso ajustar as velas e olhar mais uma vez a bússola. E José Manuel Moran foi traçar rotas em mares nunca dantes navegados. A novidade é que "hoje temos a possibilidade de os alunos participarem de ambientes virtuais de aprendizagem". O grande desafio é "motivá-los a continuar aprendendo quando não estão em sala de aula".
Os educadores que não quiserem se lançar ao mar, muito apegados à terra firme, poderão ficar a ver navios. Mas não há mais porto seguro: o oceano de informações que a Internet disponibiliza aos alunos obrigará os professores a se atualizar constantemente e a se preparar para lidar com as múltiplas interpretações da realidade. Espanhol que atracou no Brasil, Moran abandonou por alguns momentos sua tripulação do curso de Rádio e Televisão da Escola de Comunicações e Artes da USP e nos concedeu esta entrevista.
O senhor diz que não se deve esperar soluções mágicas da Internet. Que expectativas devemos ter das novas tecnologias na educação?
Prof. José Manuel Moran - Nós esperamos que a tecnologia — teoricamente mais participativa, por permitir a interação — faça as mudanças acontecerem automaticamente. Esse é um equívoco: ela pode ser apenas a extensão de um modelo tradicional. A tecnologia sozinha não garante a comunicação de duas vias, a participação real. O importante é mudar o modelo de educação porque aí, sim, as tecnologias podem servir-nos como apoio para um maior intercâmbio, trocas pessoais, em situações presenciais ou virtuais. Para mim, a tecnologia é um grande apoio de um projeto pedagógico que foca a aprendizagem ligada à vida.
Apesar de ser professor de novas tecnologias, o senhor acredita que, antes disso, há uma mudança mais urgente a ser feita no modelo de educação. Qual seria essa mudança?
Prof. José Manuel Moran - O que estamos vendo é que formas de educar com estrutura autoritária não resolvem as questões fundamentais. A questão não é tecnológica, mas comunicacional. A tecnologia entra como um apoio, mas o essencial é estabelecer relações de parceria na aprendizagem. Aprende-se muito mais em uma relação baseada na confiança, em que alunos e professores possam se expressar. Criar e gerenciar esse ambiente é muito mais importante que definir tecnologias. Embora eu trabalhe com elas, noto que o foco está na interação humana, presencial ou virtual. Preocupa-me muito a dificuldade que temos em estabelecer relações participativas, porque todos nós carregamos estruturas tremendamente autoritárias, sendo submissos ou dominadores, e reproduzimos isso na escola. A cultura da imposição, do controle, é talvez a barreira mais difícil de derrubar no processo pedagógico.
O senhor faz uma distinção entre ensino e educação, esta última sendo a integração do ensino com a vida. É evidente a maneira como as novas tecnologias podem contribuir para o ensino. Mas como elas podem contribuir para a educação?
Prof. José Manuel Moran - Quando falamos de ensino, focamos a aprendizagem de alguns conteúdos. A educação é um processo muito mais integral, que nos ocupa a vida toda, e não somente quando estamos na escola. E o professor tem esses dois papéis: ajudar na aprendizagem de conteúdos e ser um elo para uma compreensão maior da vida, de modo que encontremos formas de viver que nos realizem e desenvolvam nossas capacidades. Isso não depende da tecnologia, mas da atitude profunda do educador e do educando, de ambos quererem aprender. A tecnologia pode ser útil para integrar tudo que eu observo no mundo no dia-a-dia e para fazer disso objeto de reflexão. Ela me permite fazer essa ponte, trazer os conteúdos de forma mais ágil e devolvê-los de novo ao cotidiano, possibilitando a interação entre alunos, colegas e professores.
Uma de suas experiências mais bem-sucedidas consiste em partilhar os resultados das pesquisas escolares pela Internet. Que mudança isso provoca no rendimento dos alunos?
Prof. José Manuel Moran - É uma concepção do aprender de forma cooperativa e não competitiva. A aprendizagem estava muito voltada só para conseguir notas, ver quem chegava primeiro. Dentro dessa visão — que não se dá apenas com a tecnologia, mas também na sala de aula comum —, a proposta é colocar a interação na prática. Hoje temos a possibilidade de os alunos participarem de ambientes virtuais de aprendizagem, tanto de uma forma simples, publicando um trabalho em uma página, quanto criando debates, fóruns ou listas de discussão por e-mail. Cada escola e cada professor, dependendo do número de alunos que ele tenha ou da situação tecnológica em que se encontra, pode buscar soluções mais adequadas. O importante é o foco, que o aluno e o professor sejam estimulados a fazer parte de um espaço virtual de referência que disponibilize o que é feito em sala de aula. Eu creio que essa área de visibilidade liberta a sala de aula do espaço e do tempo físico. Porque depois, fora da aula, pode-se encontrar um pouco do que foi dito pelo professor, o que foi feito pelos alunos.
O senhor afirma que as novas tecnologias exigem muito esforço dos professores e, por outro lado, defende que "o aluno já está pronto para a Internet". Em que aspectos o aluno estaria em vantagem em relação ao professor?
Prof. José Manuel Moran - Ele é privilegiado na relação que tem com a tecnologia. Ele aprende rapidamente a navegar, sabe trabalhar em grupo e tem certa facilidade de produzir materiais audiovisuais. Por outro lado, o aluno tem dificuldade de mudar aquele papel passivo, de executor de tarefas, de devolvedor de informações. Na prática, acaba assumindo um papel bastante passivo em relação às suas reais potencialidades. O aluno tem capacidade de ir muito além, ele está pronto. Porém, a escola impõe modelos autoritários, voltando ao começo, quando o professor controlava e o aluno executava. E isso não o motiva. Por isso, a mudança mais séria deve vir mesmo dos professores. O novo professor dialoga e aprende com o aluno. Isso pressupõe uma certa humildade que nos custa como adultos a ter. Nós queremos ter a última palavra.
Novamente baseado em suas experiências em sala de aula, o senhor observa que muitas vezes a navegação é mais sedutora que o trabalho de interpretação e concentração que a pesquisa exige e o professor deve estar atento para evitar que os alunos sejam muito dispersos em suas pesquisas. Isso significa que o professor terá, diante da tecnologia, de reproduzir o modelo de controle a que o senhor se opõe?
Prof. José Manuel Moran - Essa é uma questão difícil de resolver na prática. Muitos alunos estão numa fase da vida ainda de deslumbramento, estão curiosos. Eles não têm organização e maturidade para se concentrar em um só tema durante uma hora. Então eles abrem mil páginas ao mesmo tempo, se deixam naturalmente seduzir por certos temas musicais ou eróticos, conforme a sua idade. Esse conjunto de questões dificulta o trabalho com um tema específico. Essa também não é uma questão meramente da tecnologia ou do professor, mas da dificuldade de concentração diante de tantos estímulos.
Há um paradoxo nessa questão. Há uma quantidade de informação quase inesgotável acessível pela Internet. Por outro lado, quando se é confrontado com esse volume de informação, há a tendência de dedicar menos tempo à análise pela compulsão de navegar e descobrir novas páginas. Como se pode contornar isso?
Prof. José Manuel Moran - Em primeiro lugar, reconhecendo que há uma grande dificuldade. A Internet traz saídas e levanta problemas, como, por exemplo, saber de que maneira gerenciar essa grande quantidade de informação com qualidade e como encontrar no pouco tempo que temos em sala de aula, ou na interação via Internet, algo que seja significativo, que não seja somente lúdico. Porque o que interessa é se essa navegação me leva a uma compreensão maior da realidade. Do ponto de vista metodológico, procuro um equilíbrio: nem impor demais o processo, que amarra o aluno, nem deixar que as coisas aconteçam a seu bel-prazer. Eu trabalho com dois momentos. No primeiro, mais aberto, eu coloco um tema em discussão e o aluno procura a informação por si. Depois de um certo tempo, passamos a partilhar o resultado das pesquisas, focamos um determinado artigo ou outro material, para que não fique muito disperso. Mas é importante que os alunos não atendam somente a uma determinação prévia do professor. Creio que esse pode ser um caminho para minimizar a clara tentação de dispersão na pesquisa via Internet. A Internet reforça a tendência dispersiva que os alunos têm no cotidiano, quando eles ficam estudando e ouvindo música, tudo ao mesmo tempo.
Outro equilíbrio que o senhor considera difícil de alcançar é entre o deslumbramento dos alunos pelas novas tecnologias e a resistência de alguns dos professores a esses novos métodos de acesso à informação.
Prof. José Manuel Moran - Eu percebo que as atitudes vão mudando aos poucos, que já houve resistência maior. Mas há professores que inconscientemente fazem o mínimo possível para utilizar a tecnologia, no máximo usam o Word. Eles não usam técnicas de pesquisa ou de apresentação mais avançadas em sala de aula, nem trabalham com criação de páginas. Então há uma parte dos professores de escolas particulares que, mesmo tendo laboratórios e acesso à Internet, resistem a métodos que não sejam tradicionais. Por outro lado, há os que descobrem as novas mídias e esquecem uma série de formas que podem ser interessantes em sala de aula, preferindo sempre jogar os alunos no laboratório, como se fosse uma grande solução. A Internet nos ajuda, mas ela sozinha não dá conta da complexidade do aprender hoje, da troca, do estudo em grupo, da leitura, do estudo em campo com experiências reais. Equilibrar o melhor do ensino presencial, o estarmos juntos, e o melhor do espaço virtual é básico. Mas ninguém teve experiência até agora com o equilíbrio desses ambientes. Antes aprendíamos juntos apenas em sala de aula, e o aluno tinha de se virar para fazer suas atividades quando não estava na escola. Hoje podemos aprender quando não estamos fisicamente juntos.
O senhor atribui essa resistência ao fato de as novas tecnologias colocarem em xeque a posição do professor como detentor do saber. O aluno pode facilmente pesquisar algum tema e ver que há interpretações divergentes e que aquilo que o professor fala pode não ser bem assim. O senhor sente esse receio nos professores com os quais convive?
Prof. José Manuel Moran - O professor, desde que surgiu o livro, sempre teve um pouco de receio de que o aluno aprendesse outras versões além da dele. Só que hoje você tem muitas outras formas de informações em qualquer mídia, e a Internet agrava ainda mais a sensação de que o aluno pode encontrar informações que o professor não tem. Para o professor inseguro, é uma espécie de desafio encontrar uma prática que não seja a do controle. A tentação desse tipo de professor é fechar em cima de uma única versão. O professor mais maduro trabalha com múltiplas visões, tentando relativizar nosso conhecimento, mostrando que estamos construindo algo que é provisório. A nossa visão agora é esta: eu aprendo com o que o outro me traz. Essa visão é muito mais tranqüila. É a aceitação de que eu não sou onipotente, que não tenho respostas para tudo, não sou enciclopédia. Eu aprendo melhor reconhecendo a minha ignorância.
O senhor insiste em seus textos na importância da maturidade do professor ao lidar com a tecnologia. Quais são as experiências mais maduras que conhece de uso da Internet em sala de aula?
Prof. José Manuel Moran - Hoje há muitas escolas que estão tentando encontrar saídas. O que a maior parte delas faz é colocar os alunos em contato com a Internet em laboratórios e depois buscar atividades principalmente entre grupos que não estão fisicamente juntos. No mundo inteiro se trabalha com esse tipo de projeto. A etapa mais avançada, que começa agora na minha opinião, é desenvolver o conceito de gerenciamento de aula, integrando o que é feito pelos alunos quando estão juntos e fazendo com que o processo de aprendizagem continue quando eles não estão mais juntos. Hoje há uma série de programas de gerenciamento de ambientes virtuais que ajudam a trazer temas para a sala de aula. No fundo, é uma página incrementada com ferramentas de chat e de fórum em que os alunos vão colocar seus textos. Há uma série de softwares como o Eureka, o First Class, o Web Ct e o Blackboard.
De que forma o senhor utiliza esses ambientes virtuais mais integrados em seu processo pedagógico?
Prof. José Manuel Moran - Coordeno um curso de pós-graduação semipresencial em que, em alguns momentos, nós nos encontramos e, em outros, interagimos somente através da rede: apresentamos textos, discutimos questões. Temos a relação de uma aula presencial para duas virtuais. É o desafio que vamos enfrentar pelo menos no nível superior, fase em que os alunos não precisam ir todos os dias à aula. O desafio é motivá-los a continuar aprendendo quando não estão em sala de aula. Também estou coordenando programas de educação a distância em São Paulo. Educar a distância, mas de uma forma em que haja troca e não somente repasse de informação, que não seja somente colocar conteúdo em uma página e depois cobrar uma atividade. Estimular o aluno a aprender em ambientes virtuais é outro grande desafio pedagógico que temos hoje. Haverá muita "picaretagem" de instituições que pensam que educação a distância é uma forma de ganhar dinheiro.
O que o senhor teria a dizer a um diretor de escola pública, carente de recursos e com professores que nem sempre são os mais bem qualificados? Nessas circunstâncias é mais indicado investir em tecnologia ou centrar-se na capacitação de professores?
Prof. José Manuel Moran - Eu acho que não podemos mais ficar apenas nos lamuriando da falta de condições. É verdade que um diretor de escola não pode fazer nada sozinho. Isso exige vontade e investimentos públicos nos três níveis. Estou coordenando uma equipe que desenvolve um programa de educação a distância na rede pública estadual de São Paulo para capacitar professores, supervisores de ensino e pessoas que trabalham em Oficinas Pedagógicas (OTP). São profissionais que estão mais em contato com novas tecnologias. Na verdade estamos fazendo a capacitação em serviços a distância, juntando a Secretaria de Educação e a Universidade de São Paulo, através de uma fundação chamada Vanzolini, com o apoio do governo federal, do ProInfo.
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Vitor Casimiro
Exclusivo para o Educacional

Fonte:http://www.eca.usp.br/prof/moran/entrev.htm